sábado, 19 de julho de 2008

À flor da pele!

"Veja com os dedos, se as pontas alongadas e insensíveis do coração de seus olhos não conseguem enxergar!", penetrava em mim esta ordem enquanto insistia em passar este creme hidratante pelo meu corpo. A densidade da loção exigia um esforço muito maior do que as minhas mãos costumavam fazer. Não era acostumado àquele toque bruto! Precisava alisar, apertar e esfregar em sucessivas camadas, em um esforço inútil para que a beleza prometida por aquele frasco penetrasse em mim.

A sensação era um deleite! A cada esfregada, sentia o creme misturado a uma essência intangível entrava de dentro de mim. Aos poucos, vai me dominando. Começa a atingir uma camada interior, uma derme abaixo da epiderme, impenetrável como uma cebola, mas com certas fendas parecidas com um queijo suíço. Essa mistura tornava-se um patê misterioso de um crescente auto-conhecimento.

Os toques, os pêlos, a pele, seus pequenos defeitos tudo isso - eureca! - era Eu. Um Eu até agora insuspeito, implorando para ser descoberto, buscando a real certeza de um tesouro guardado nas profudezas do mar vermelho de meu interior. A mistura do branco do creme à coloração sangüínea resultava em uma textura rosácea, cristalinamente rosácea, que lembra uma adolescência debutamente virginal. Sim, era um novo recomeço. E com um aurora dessas, é impossível sentir solidão.

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