segunda-feira, 21 de julho de 2008

A mágica da feira

Feiras livres devem existir em todas as cidades do mundo, mas duvido que qualquer uma delas reúna os elementos que tornam uma compra a uma feira de São Paulo um acontecimento mágico. Depois de muitos anos, eu fui com um amigo a uma feira livre. Iria acompanhá-lo apenas, mas acabei não resistindo e comprei algumas coisinhas que precisava para casa.

Pra começar, aquela enorme recepção com o pastel da família japonesa a postos. Pode dizer o que for: que faz mal, que está repleto de gordura saturada, que é frito num óleo que já serviu para coisas que até Deus e o Diabo duvidam, mas o fato é que não existe algo mais saboroso, mais divino que um pastel. E se tem que enfiar o pé na jaca, que seja um feito bem especial: com carne moída, ovo cozido, queijo, presunto e azeitona.

Pronto, já existe um forte motivo para você concluir a feira. É obvio que o sabor do pastel ficará mais ressaltado depois das compras, tal como um acorde que arremata o término de uma bela sinfonia. Partamos para as barracas de frutas, legumes, verduras, onde, apesar de predominante, o verde faz uma combinação elegante e simbólica com o vermelho do tomate, o alaranjado das cenouras e cítricos e mesmo os apimentados vermelhos e os abeterrabados roxos. Depois do olfato, agraciado com o suave e forte cheiro do pastel, é o olhar que agradece o descanso oferecido pelos produtos expostos.

E os ouvidos? Ah, os ouvidos são contemplados pelos gritos, pelas formas encontradas pelos feirantes, em sua simplicidade de expressão em conquistar a dificil atenção das clientes, fazendo contas subterrâneas ou atacando verozmente suas calculadoras em busca das melhores condições. "Moça bonita não paga, mas também não leva!", "São onze horas e ainda nada", "Madame vem experimentar a fruta, abacaxi docinho, docinho", essas expressões, onomatopéias gentilmente elaboradas, por si só, já dariam uma única crônica.

Na ala das carnes, peixes, frangos e afins, um espetáculo um pouco mais sombrio. É preciso um pouco mais de paciência para suportar o forte odor que exala de salmões, frangos, fígados, bovinos e frutos do mar expostos, escancarados em suas entranhas, prontos para se mancomunar com temperos e se transformar em manjares dos deuses, por meio da ação de boas mães ou de boas empregadas que prepararão pratos amorosos e saborosos.

E, por fim, a ala das quinquilharias. Tudo para o lar, aqui nós amolamos facas, consertamos peças de fogão, fazemos qualquer negócios. E toda a feira que se preze vendem aqueles carrinhos de borracha, fusquinhas feitos de plástico simples, mas que fazem qualquer garoto viajar. Ou aqueles sucos, coloridos artificialmente, embalados em plásticos transparentes, que fazem a alegria de qualquer garotinha despreocupada em sobreviver em um mundo onde os noticiários nos dão conta de todos os perigos que nos cercam.

Enfim, um passeio pelas feiras paulistanas pode ser uma inesgotável fonte de saciedade. Para os sentidos, para a alma, para o espírito. E, também para o corpo. Afinal, como eu disse, aquele pastel especial do japonês está à nossa espera. Junto com o caldo de cana. Que dispenso. Prefiro morder a cana com meus próprios dentes.

2 comentários:

Paty disse...

Feira é uma cultura, graças a Deus, sobrevivente ao vício mercadológico e ao consumismo globalizado; a produção tercerizada em larga escala com seus conservantes, todo processo muito rápido e preciso...evitam ao máximo o contato humano com o produto...
Tudo está lá, pronto nas prateleiras dos supermercados...
Cada vez mais perdemos nossas origens...O homem aniquila seu meio e distancia-se dele!
Comer um pastel de feira é saborear a vida!Toda origem, todo processo manual, toda energia resgatada, o suor da madrugada, as barraquinhas armadas, pessoas despreocupadas... são momentos como esse que lembranças dóceis e infantis nos tomam os sentidos e a alma respira!!!
Lindo texto querido! Adorei!!! Tbém quero ir a feira , não esquece di ieu !!!! hehe... bjaumm

Unknown disse...

Ai que delícia, seu texto lembrou minha infância, quando eu comprava os suquinhos nas ambalagens de plástico, ou sentia aquele cheiro acentuado de peixe...coisas simples que devemos retomar na vida, assim como você fez. Amei o blog, por isso colocarei o link no meu.
Beijos.